“Estou
sentindo muita raiva”
Fabíola Sperandio
Teixeira
Pedagoga –
Psicopedagoga
Terapeuta de Família
e Casais
Assim mesmo iniciou-se a conversa com a
Fabiana. Com essa frase carregada de indignação. Sim! Ela estava indignada com
o seu próprio sentimento. Aquela menina linda, muito meiga, mas também cheia de
personalidade, mostrava-se inquieta com o que sentia. Parecia não saber o que fazer
com essa raiva ou parecia que não podia se permitir sentir.
Contou-me sobre o que provocou a danada
RAIVA. À medida que contava, ora se enfurecia, ora permitia algumas lágrimas
correr em pleno rosto. Fabiana se julgava o tempo todo por não conseguir se
compreender.
Essa doce menina que se dizia com raiva
do pai, na verdade, estava decepcionada com ele e com muita raiva de si mesma.
Explico. Fabiana estava decepcionada porque o pai fez uma promessa e não cumpriu.
Ela sempre acreditava nele e não conseguia admitir que ele falhara com ela. O
pai havia prometido nunca mais atrasar para buscá-la, prometeu priorizar a
união dos dois, mas não conseguiu sustentar o prometido. Fabiana estava com
muita dor no coração. Sentia a decepção muito forte e ficou com raiva do pai e
de si mesma. Perguntava-se o motivo que o fazia afastar-se da promessa com
tanta facilidade. Não entendia o porquê de não priorizar os momentos ao lado
dela. E a raiva? A raiva vinha após o sentimento de decepção. Raiva dele e raiva de si. Estava revoltada
por ter dado chance ao pai.
Eu via
aquele olhar aflito e sedento por um desejo de ter esse pai no mais puro
sentimento do seu coração. Ela não conseguia se perdoar por estar com muita raiva
do próprio pai, aquele que ela tanto ama, porém vê a admiração comprometida
pela “falsa” promessa. Sentia que aquele pai tão austero ( “de caráter severo, o qual se reflete na
rigidez das opiniões, dos hábitos, no rigor consigo mesmo e com os outros. De
pouca flexibilidade ou nenhuma; rígido, rigoroso” Fonte: Dicionário Google) não
poderia agir assim.
Quando
ela terminou de relatar sua dor, um choro compulsivo e incontrolável a dominou.
Permiti que chorasse. Percebi que esse choro estava preso dentro dela por
muitos dias. Enquanto chorava, ela tampava o rosto com as mãos. Parecia que
queria se esconder. Como se não fosse permitido a ela chorar por sua dor. Como
se ela tivesse que engolir a decepção e o choro. Era muito dolorido tudo isso
para aquela garotinha.
Fabiana
é alta, teve o “estirão” cedo, e sentia que se cobrava e talvez era cobra a ser
forte como se tivesse mais idade. Fabiana tem uma aparência forte e alegre, no
entanto, por dentro é doce e sensível. Aproximei-me. Ofereci um ombro acolhedor.
Ela se ajeitou nele. Encostou a cabeça e depois se virou e me abraçou forte.
Olhou nos meus solhos e perguntou: “Por que é tão difícil entender que as
pessoas não são com a gente como a gente procura ser com elas? “.
Olhei
nos olhos dela, levantei os cabelos para que se refrescasse e conversamos sobre
as diferenças. Procurei mostrar a ela que respeitar as diferenças não significa
aprovar as atitudes do outro, mas procurar compreender que cada um oferece o
que tem. E que, muitas vezes, encontraremos pessoas que terão dificuldade de
serem empáticas. Que, naquele momento, o papai dela ainda não tinha conseguido
fazer o movimento de se colocar no lugar dela. Fabiana olhava atenta.
A
conversa foi fluindo de uma forma que a fizesse entender que ela precisava se
manter fiel aos seus ideais de relação com o pai, porém sem criar expectativas
que gerassem tanta frustração. Procurei mostrar a ela que por amor a si e ao
outro, ela deveria manter-se alimentada de esperança nas mudanças que podemos
gerar no outro quando mudamos também. “Como assim? ” _ me perguntou com
interesse.
Mostrei
a ela que, quando alimentamos o nosso amor próprio, conseguimos focar mais em
nós mesmos do que no outro. Que a felicidade dela não pode estar condicionada às
promessas do pai, mas no que ela mesma busca de momentos felizes. Exemplo: o
pai novamente descumpriu um combinado. Entenda que o erro não está na filha
Fabiana, no não querer estar com a Fabiana, todavia na dificuldade do pai em
entender sobre compromissos, expectativas, respeito, consideração. Na
dificuldade do pai em ser empático com o outro que espera por ele. Fui mostrando que, nos momentos que isso
ocorrer, ela troque a raiva por compreensão das dificuldades desse ser e busque
focar em algo que lhe gere prazer, aquisição de conhecimento, como uma leitura,
um telefonema para alguém interessante, um filme, um bate papo com quem estiver
em casa ou até um hobby.
Fui
mostrando que ela estava focada no pai e deixando de focar nela. Quantas coisas
maravilhosas ao nosso alcance e nos permitimos nos entristecer por um
descompromisso do outro conosco. Fabiana, de 14 anos, começou a fazer um
paralelo da nossa conversa com as amizades da escola, primas, namoricos. Foi
interessante vê-la ampliando o olhar a partir da dor que sentia por atitudes do
pai.
Terminamos
a conversa. Percebia-a mais forte. Ainda decepcionada com o pai, mas
interessada em lidar melhor com a dor e disposta a utilizar o aprendizado nas
diversas situações das relações sociais.
Fabiana
agradeceu e retornou para sala de aula. Fiquei olhando-a ela subir as escadas.
Torcia muito para o alívio da dor e revolta. Não demorou 10 minutos e olha a
Fabiana de volta. Desta vez com uma colega. “Fabíola, você pode conversar com a
Jéssica? Ela precisa compreender umas coisinhas também.” Eu sorri e pisquei
para ela. Ali entendi que a conversa fizera bem. Agora vou cuidar da Jéssica.
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