Será que conheço e
continuarei reconhecendo meu filho com o passar dos anos?
Fabíola Sperandio Teixeira
Pedagoga – Psicopedagoga
Terapeuta de Família e Casais
Especialista em Gestão e Organização em Centros Educacionais.
Mestre em Educação
Foram vários dias pensando naquela mãe. Vários dias
refletindo sobre as suas palavras. Refiro-me à mãe do fã que protagonizou uma
cena de novela com uma apresentadora famosa. O que leva uma mãe a ser tão
surpreendida com um ato repentino de seu filho? Seria algo repentino ou ignorou
os sinais? Quais os “nossos pecados” como pais?
É exatamente esta reflexão que pretendo promover. Um jovem
por volta dos trinta anos foi um dia uma criança e um adolescente. Todas as
nossas atitudes paternas contribuíram de alguma forma para alertar (porém sem
sermos ouvidos), camuflar (omissão) ou exacerbar suas atitudes. Um homem de
trinta anos já é capaz de responder por seus atos, mas vamos voltar lá na
infância. Não me refiro à infância deste desconhecido, mas irei refletir sobre
o nosso papel de pais na infância de nossos filhos.
Geramos uma série de expectativas sobre as nossas crias
quando nascem. Sonhamos por eles, desejamos por eles e projetamos um futuro
promissor para os amados filhos.
E dentro desse caminhar, muitas vezes os
olhamos com os olhos dos nossos sonhos e deixamos o olhar da realidade de lado.
Não queremos ver que algo está os desviando do que foi projetado. E é aí que
mora o perigo ou moram os perigos.
Primeiramente precisamos compreender que não podemos projetar
os nossos desejos para que o outro os concretize. Quem somos nós para
determinar o futuro para os nossos filhos? Este é o nosso papel? Não! O nosso
papel é nortear, conduzir e orientar nossos rebentos em seu caminhar. Mostrar
os valores éticos e morais e não os permitir desviarem-se deles. Já quanto à profissão e a outras decisões futuras, precisamos
permitir que façam as suas escolhas responsáveis e assumam as consequências. É
um grande erro colocar o peso de nossos sonhos nos ombros de quem acabou de
chegar a nossa família: o nosso bebê.
O segundo grande erro é não querer enxergar que o nosso filho
está com um comportamento diferente. Aceitar tudo como: “É o jeito dele”; “Tadinho,
ele é tímido”; “Não consegue controlar seus impulsos, preciso aceitar! ”; “Fica
horas no quarto entretido com a internet, nem dá trabalho.” Educar é diferente
de ser legal ou complacente. Há pais que querem ser amigos, “gente boa”, “legalzão”
e incluem a aceitação de tudo neste pacote. Pode até ser repetitivo, mas pais
precisam ser pais. Primeiro lugar, a missão da paternidade. Com o tempo, os
pais também se tornam amigos, desde que a missão maior já tenha sido arraigada
na criação.
A mãe citada inicialmente insiste em ressaltar que seu filho
era incapaz de protagonizar tal cena. Ela o via como um filho exemplar, pacífico,
amoroso, que a levava ao cinema e vivia em casa no quarto, chamando-o de
caseiro e companheiro.
Seu amor extremado a impedia de achar estranho um homem
de 30 anos ainda permanecer no lar dos pais, não ter emprego e viver só no
quarto, na internet. Como tinha atos educados e gentis, era tido como acima de
qualquer suspeita de desvio de conduta. Será que ao longo de sua infância não
demonstrou comportamentos que poderiam ser vistos como sinal de alerta?
Mas a que devemos atentar no comportamento de nossas
crianças?
- ·
Seu
filho consegue interagir com as outras crianças ou prefere se isolar ou ficar
com adultos?
- ·
Tem
hábito de contar sobre as suas aventuras escolares ou nos parques ou sempre se incomoda
se é indagado de como foi seu dia?
- ·
É
carinhoso com todas as pessoas ou apenas com alguns escolhidos?
- ·
Percebe
que age em busca de ganhos secundários ou seus atos são naturais?
- ·
Possui
fixação por algum brinquedo e chega a não o dividir ou tem preferência por
determinado brinquedo, mas sem ser tão egoísta?
- ·
Percebe
que tem uma fala fixa em determinado assunto ou fala livremente sobre tudo?
- ·
Deixa
tudo em seu quarto com livre acesso a todos ou às vezes o encontra assustado
com uma entrada repentina de alguém?
- ·
Seus
aparelhos eletrônicos são divididos facilmente com todos ou se irrita com a
possibilidade da aproximação dos mesmos?
- ·
Mantém
uma postura cortês com estranhos e, em casa, se mostra introspectivo e é gentil
apenas com um membro familiar (o escolhido)?
- ·
Possui
falas carregadas de sentimentalismo e insegurança, mostrando até uma atitude
possessiva (“Não sobrevivo sem você, minha mãe!” ou “Se fulano me largar, eu
morro!”)?
- ·
Tem
atitudes e falas que remetem ao campo fértil do imaginário trazendo algo
distante de seu cotidiano?
- ·
Demonstra
uma carência enorme mesmo estando em um lar amoroso?
Estas não são regras e muito menos uma receitinha de
observação, mas apenas um conjunto de situações às quais devemos ligar o
alertar e procurar intervir de maneira efetiva e eficaz para resgatar as nossas
crianças e adolescentes para o mundo familiar.
Muitos jovens mergulham no mundo
virtual e fazem dele o seu mundo. Depois, a qualquer revelação que mostre que a
realidade é outra, a desestruturação de sua criação imaginária o desestabiliza,
trazendo sérios estragos emocionais.
Muitos jovens entram em redes sociais sem o mínimo de
amadurecimento para tal. Não sabem diferenciar o que é real do que é postado.
Chegam a se sentirem íntimos de determinadas pessoas por acompanhá-las tão de
perto. Muitas vezes até se tornam insatisfeitos com a vida que possuem por
acreditar que a vida do outro é muito mais feliz, agitada e recheada de
prazeres. Os deveres e os dissabores não são postados nas redes sociais, em sua
maioria.
Precisamos estar bem próximos de nossos filhos. Questione
tudo o que aparecer por parte deles: precisam estar em redes sociais antes dos
15 anos? São necessárias saídas aos shoppings com amigos sem a presença de
adultos? Estão preparados para dizer não àquilo que já internalizaram como
regras e valores familiares? Precisam dormir fora de casa para se divertirem
com amigos (lembrando que não temos garantias do que assistirão no lar alheio)?
estas e outras que, ao deparar com ações inesperadas de
jovens de uma classe social onde puderam frequentar bons lugares, tiveram pais
presentes e contam com depoimentos de familiares que se mostram espantados com
o resultado final da cria conhecida de todos, é que me pergunto: por que
permitimos que a emoção se sobreponha à razão no que diz respeito à criação de
nossos pequenos?
Voltando ao caso inicial, como um homem de 30 anos chega a
essa idade sem estudo e sem trabalho, só focado na internet e a família ainda
vê normalidade? Por que acabamos por
fechar os olhos para atitude do amor platônico e não conseguiram ver os
exageros postados para apresentadora? De que forma este adulto conseguiu
dinheiro para viajar, hospedar-se e comprar uma arma? Será que não era
beneficiado por se portar como bom filho e, talvez o ganho secundário da mãe
diante de um filho amoroso não a fez oferecer tudo o que o mesmo necessitava,
gerando a acomodação? O que o fazia ter motivação para cuidar do físico, uma
vez que era o único lugar em que tinha assiduidade era a academia? Uma pessoa
deprimida por ociosidade não consegue ser disciplinada para exercícios físicos
e culto ao corpo.
São estas e outras indagações que me levam a pensar em como
estamos agindo com as nossas crianças. Estamos atuando como pais que motivam os
filhos a irem à luta dentro da realidade ou os poupando de enfrentar os deveres
da vida por acreditar que precisam ter o que não tivemos? Teremos uma geração
de vitoriosos e bem-sucedidos emocional e profissionalmente ou uma geração de
jovens focados nos direitos, até mesmo o direito de posse de alguém que ele
imagina ser uma pessoa que corresponda a seu amor platônico? Nossos filhos
saberão lidar com as frustrações, rejeições e decepções ou farão qualquer coisa
para obter a realização dos seus desejos? Será que, quando não frustramos
nossos filhos não estamos enviando a mensagem de que são príncipes e princesas
e podem tudo?
Que possamos aprender com cada episódio que a vida traz. Que
possamos aprender diariamente a ser pais mais focados em ensinamentos a curto e
longo prazo. Que a permissividade e a cultura do consumismo estejam cada vez
mais distante de nossos amados filhos. Que possamos trabalhar o valor moral e
ético com sabedoria e maturidade. Que a recompensa seja nunca passarmos por
situações como a estampada em todos os jornais e redes sociais, trazendo um dor
a todos que ninguém conseguirá amenizar.
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