Crianças
desanimadas. Por quê?
Fabíola Sperandio
Teixeira do Couto
Pedagoga-
Psicopedagoga
Terapeuta de Família e
Casais
O dia a dia ao lado de tantas crianças me revigora e me
preocupa. Revigora porque a pureza e a
energia delas me contaminam e me fazem sentir mais jovem também. Fico sedenta por não perder a magia da minha
criança interior. Mas a preocupação com o desânimo que emanam tem me consumido.
Por que se sentem desmotivadas? O que as faz ter aspecto cansativo e triste?
Em constante bate-papo, foi fácil detectar o aparente:
rotina escolar; agenda pós escola; pressão social e familiar. Ok! Mas isso é o
propósito da vida moderna. Precisei aprofundar-me. O que desta rotina conhecida
tem desencadeado a tristeza e a falta de ânimo de tantos jovens?
Infelizmente detectei a imaturidade dos adultos em seus
diálogos com os filhos. Adultos que só fazem cobrança e falam de futuro. Uma
fala decorada e abusiva até. Falam tanto no futuro que não permitem que a
criança tenha presente.
Um dos grandes pesos que percebi nas crianças com as quais
conversei é a pergunta sobre a escolha da profissão tão precocemente. Por que
pressionamos os nossos filhos sobre o que serão, aos 10 anos? Por que temos
tanta ansiedade projetada neles? Por que não permitimos que sejam apenas
crianças e alunos correspondentes à série em que estão?
Ouvindo uma criança de 5º ano, ela me disse: “Tia Fabíola,
quando eu estava no 4º ano, a minha família e a escola não me tratavam como
aluno de 4º ano. Ficavam falando que eu tinha que estudar porque o 5º ano era
mais difícil. Hoje estou no 5º ano e fazem a mesma coisa, falando do 6º ano. Eu
nunca posso viver a série em que estou.
Eles sempre ficam falando, falando que tenho que dar conta por causa do futuro.
E eu tenho medo do futuro. Não sei se vou dar conta. Está tudo muito rápido.”
Meu coração doeu. “Está tudo muito rápido”. Voltei a minha
infância e lembrei que tudo parecia longo. Muito diferente do que a sente.
Senti uma enorme parcela de contribuição para este sentimento dela. Será que
não estamos deixando as nossas crianças terem infância? Com certeza, em muitos
casos, as famílias estão encurtando as fases.
Outro aspecto que percebi nas entrevistas foram as
reproduções das conversas das famílias. Famílias que trazem tanto conteúdo
adulto que as crianças já estão sofrendo com a possibilidade de se tornarem
parte deste mundo “cruel”. São tantos discursos, tanto sermão, tanta realidade
que não estão se sentindo motivadas a crescerem. Só que ser crianças também não
estão permitindo. E aí? O que resta a elas?
Bom, quando se sentem acuadas, desanimadas e assustadas com
o mundo apresentado, elas estão buscando válvulas de escape. E muitas vezes
esta válvula tem trazido riscos: aventuras, redes sociais, jogos, apoio em
alguém desconhecido, afastamento familiar e aproximação ao que parece acolhedor
ou menos chato.
E qual a medida entre permitir que sejam crianças e
apresentar o mundo real? A medida é respeitar a idade delas. E entender que
devemos dar um passo de cada vez. Que posso inserir tarefas e reflexões de
acordo com a maturidade delas e não de acordo com o meu desejo de adulto.
Outro ponto essencial é falar menos e escutar mais. Crianças
e adolescentes precisam de escuta. Conhecê-los fará muito bem à família porque
proporcionará a medida da inserção a cada fase.
Precisamos entender o motivo de crianças e adolescentes se
sentirem tão entristecidos e sozinhos. Conversando com eles, a sensação de não
serem compreendidos é tão presente e tão dolorosa que chega a me assustar. E
qualquer pessoa com esta sensação fica impossibilitada de enxergar prazer e
motivação.
É preciso esvaziar estas dores e insatisfações das crianças
e preencher com amor e esperança. Coloque-se no lugar delas. Experimente ser o
ouvinte dos seus intermináveis discursos, do seu queixume sobre a rotina do
trabalho, da sua preocupação econômica, das suas observações sobre a política
brasileira. Diante disso, se você fosse criança, estaria motivado a crescer? Conseguiria
projetar, aos 10 anos, a profissão desejada?
Um aspecto cruel que estamos fazendo com os nossos jovens é levá-los
a se preocupar com as provas que enfrentarão no vestibular e ENEM. Não
mostramos sentido na aprendizagem. Não permitimos que sintam prazer na
aquisição do conhecimento. Mandamos uma mensagem que estão na escola APENAS
para o acesso à universidade, ao curso que os fará profissional e que trará renda
para se sustentarem e enfrentarem este “mundão”. Não apresentamos a escola como
um local que permitirá aprender e relacionar-se. Um local onde poderão se desenvolver
e amadurecer naturalmente.
Diante deste quadro, é motivador crescer? Está na hora de
pararmos de nos assombrar com as tragédias oriundas do mundo do adolescente e
pensar no que os ADULTOS estão deixando de cuidar para que isso aconteça. Somos
responsáveis por tudo o que tem ocorrido com as nossas crianças e adolescentes.
Quando acordaremos?
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