“Minha
vovó foi para o céu”
Fabíola Sperandio Teixeira
Pedagoga – Psicopedagoga
Terapeuta de Família e Casais
Com os
olhos molhados de lágrimas, Davi, um garoto muito apegado à avó, vem a minha
direção e me abraça: “Como ficarei sem meu porto seguro, tia?” Restou, naquela
hora, eu abraçá-lo e mostrar que eu entendia a sua dor.
Será que temos noção do amor entre avós
e netos? Cá para nós, nem todos avós e netos se dão bem. Nem toda vovó ama seu
neto e vice e versa, mas vamos focar nesse amor que Davi demonstrou.
Perder quem amamos dói muito. A dor é
quase insuportável, mas ela passa e dá lugar para as doces lembranças. A dor
saí e vem o cheiro do café que a vovó coava logo pela manhã; a dor passa e vem
a frase “Tem que comer, menino! Você está em fase de crescimento! ”; a dor
passa e vem o cheiro do creme que ela usava.
As relações hoje estão menos próximas
em razão da rotina que estamos estabelecendo para nós mesmos e para os nossos
filhos, porém gostaria de pegar esse exemplo para que possamos pensar na
importância dos avós na vida das nossas crianças.
Muitas vezes, os adultos misturam a sua relação
conflituosa com os avós dos seus filhos e impedem que eles tenham uma
aproximação. Um grave erro!!! Devemos resolver as situações no campo dos
adultos sem envolver as crianças. TODA criança tem o direito de ter seus avós
por perto. Salvo exceções quando a companhia dos avós não é saudável para a
criança. Aí é outra história.
No entanto, Davi tinha uma relação saudável com
sua vovó. Ele a via diariamente. Ela tinha muita influência em sua formação e
ele terá muitas doces lembranças quando essa dor for embora. Bem diferente da
situação da qual falo no meu artigo ”Não quero encontrar a vovó, mamãe” https://ludovica.opopular.com.br/blogs/educar-faz-parte/educar-faz-parte-1.962126/n%C3%A3o-quero-encontrar-a-vov%C3%B3-mam%C3%A3e-1.1319599,
Davi estava lidando com o luto de uma pessoa que se fez muito presente.
Dr. Alan Wolfelt, educador e estudioso das
questões do luto, diz que as crianças têm seis necessidades no processo de
luto:
1ª necessidade:
reconhecer a realidade da morte
A criança ou adolescente precisa deparar com a
realidade de que alguém que ela amava muito morreu e que essa pessoa não mais
estará presente fisicamente. Elas lidam com a aceitação da realidade da morte
em “doses”. Permitem a entrada de “um pouco” de dor e depois voltam a brincar.
Experimentam as lágrimas e depois voltam para o celular com a “galera”. Esta
dosagem não só é normal, mas também necessária para tornar esses primeiros
momentos do luto mais suportáveis.
A criança ou adolescente pode levar muito tempo
para digerir plenamente a realidade da perda. Conforme ela se desenvolve e
amadurece, a morte assume novos significados e de maior profundidade.
2ª necessidade: sentir a dor da perda
Quando estamos em processo de luto, adultos ou crianças
também precisam se permitir sentir a dor da perda. Felizmente, a maioria delas
ainda não aprendeu a esconder ou negar os sentimentos. Se estão tristes, elas
geralmente se permitem estarem tristes. Você pode ajudar, encorajando a criança
a falar sobre pensamentos dolorosos e ouvir o que querem contar sem julgamento.
Incentive que falem de sentimentos. Você também pode servir como exemplo
demonstrando os seus próprios sentimentos. Se estiver triste, expresse sua
tristeza na presença da criança.
3ª necessidade: relembre a pessoa que partiu
Quando alguém próximo e que amamos morre, ela vive
em nós através das nossas lembranças. Crianças e adolescentes em luto precisam
relembrar a pessoa que partiu e precisam ajudar a celebrar a vida que essa
pessoa viveu. Reforçar a memória das vivências saudáveis ajudará muito. Não
tente tirar as lembranças da pessoa que morreu como uma tentativa equivocada de
privá-la da dor. É muito bom para a criança ver fotos ou assistir a vídeos, é bom
para ela contar histórias sobre essa pessoa querida que se foi, assim como
ouvir outras pessoas contarem histórias também. Relembrar o passado torna o
futuro mais possível.
4ª necessidade: desenvolver identidade própria
Sabemos que parte da identidade de uma criança é
formada pelo relacionamento que ela teve com a pessoa que partiu. Todo mundo do
grupo das nossas relações, colabora com a nossa formação. Talvez ela tenha tido
um pai e agora não tenha mais, ou ela poderia ser o irmão mais velho que agora
não tem mais a irmã caçula. Como mudou o sentido da criança sobre quem ela é
como resultado de uma perda importante? Ninguém pode preencher para a criança a
“vaga” da pessoa que partiu. Não tente achar um pai melhor amigo/avô
substituto. Algumas vezes, as crianças são encorajadas a assumirem o papel e as
tarefas que pertenciam à pessoa que morreu (exemplo: o pai morreu e a mãe fala
para o filho que ele agora é o homem da casa), o que impede o processo de
superação e injustamente rouba a inocência da infância.
5ª necessidade: procure significado
É natural quando alguém que amamos morre,
questionarmos o significado e o propósito da vida. As crianças tendem a fazer o
mesmo de forma muito simplificada através de perguntas como “Por que as pessoas
morrem?”, “Por que o papai do céu levou a minha vovó?”, “Onde ela ficará
agora?” , “O que acontece com as pessoas depois que morrem?”. Uma criança só se
sente à vontade para fazer esse tipo de pergunta, para um adulto em quem
confia. Não tente responder a todas as perguntas sobre o significado da vida.
Não tem problema, e talvez até seja desejável, admitir que você também se sente
confuso com as mesmas perguntas.
6ª necessidade: receber apoio contínuo de seus
cuidadores
O luto é doloroso mesmo. O luto é um processo, não
um evento. O luto leva tempo.
A criança enlutada precisa da compreensão, compaixão
e da presença de um adulto próximo, não somente nos dias ou semanas após a
morte de alguém querido, mas também nos meses e anos a seguir. Conforme vão
crescendo e amadurecendo, as crianças vão naturalmente processar o luto em
novos e mais profundos níveis. Uma criança que passa por um processo de luto
rodeada de suporte e apoio, tende a ser um adulto mais saudável.
*Dr. Alan D. Wolfelt, P.H.D., é autor de centenas de
livros sobre perda e luto. Conhecido mundialmente pelos seus conselhos e
mensagens de apoio e superação da perda é membro da Association of Death
Education, é premiado pelo Counseling`s Death Educator, atua como diretor do
Center for Loss and Life Transition em Fort Collins, Colorado, nos Estados
Unidos.
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