O WHATSAPP INVADIU O AMBIENTE ESCOLAR
Fabíola Sperandio Teixeira do Couto
Pedagoga- Psicopedagoga
Terapeuta de Família e Casais
Desde que surgiu mais este
recurso digital, as escolas precisaram aprender a lidar com os benefícios e
malefícios gerados por ele. Uma rede que proporciona contatos e trocas de
ideias e informações. Surgiram grupos de família, trabalho, colegas das
antigas, vizinhos e até mães e pais da escola dos filhos. Inicialmente com a
alegria de reviver velhas histórias, aproximar parentes e criar vínculos com as
mães dos amigos dos filhos. Até aí parece tudo natural e normal.
Na mesma rapidez que chegou,
trouxe a dependência de muitos. E como tudo que é novo em nossas vidas,
percebemos o desequilíbrio de várias pessoas em utilizar esta ferramenta de
forma saudável. A ausência de regras e
muitas vezes a falta de bom senso começou a gerar um certo desconforto nos
membros que participam dos grupos diversos. Relatos de desavenças familiares e
afastamentos de amigos são bem comuns após esta novidade de aproximação.
E como isso afetou a instituição
escolar?
As famílias ao iniciar o ano
letivo já criam o grupo da turma do filho e começam
a troca de informações. Muito legal se os compartilhamentos das situações
fossem responsáveis e justos. Explico. Partilhar nos grupos eventos, convites para
festividades, divulgações culturais, complementos de conteúdos pedagógicos,
sugestões literárias, possíveis caronas e ajuda entre famílias, ações
esportivas e comunitárias, entre outros, é ágil e facilitador. Entendemos,
também, que o WhatsApp promove a facilidade de estreitar a comunicação sobre
combinados e rotinas escolares.
Entretanto, estamos assistindo a outro
lado desta beleza tecnológica. Estamos acompanhando uma série de desconforto
por parte de algumas famílias que estão sendo expostas, julgadas e até
promovendo desavenças entre uma família e outra. E isso tem ocorrido porque algumas pessoas se
comportam de forma deselegante e até ofensivas quando tratam de algum tema que
faz parte do universo infantil e escolar.
O universo estudantil é recheado
de acontecimentos que promovem o crescimento educacional e social. Dentro desta
convivência é natural que os alunos tenham empatia por uns e dificuldade com
outros colegas. É também esperado que cada um possua um ritmo de aprendizagem.
Sabemos e devemos respeitar as diferenças religiosas, políticas e as regras
escolhidas por cada família (seus valores e princípios). Porém, não é o que
temos percebido pelas conversas em grupos criados no aplicativo: episódios
corriqueiros têm sido completamente distorcidos, sem nenhuma análise, cheios de
julgamentos e apontamentos aos educandos e educadores de forma superficial,
irresponsável e sem nenhuma busca pela verdade do que foi divulgado. Consequentemente,
por vezes a escola é levada a se desviar do seu maior foco, que é o PEDAGÓGICO,
para cuidar dos comentários que tanto geraram desconforto e prejuízos aos envolvidos.
Saudades dos velhos tempos onde a
escola era respeitada pela sua história e competência e estava sempre acima de
qualquer disputa com o que não fosse construtivo. O desrespeito e a
desconfiança em relação à instituição escolar escolhida pela família só emperram
o processo e prejudicam os alunos, os filhos.
Comentários surgem a cada dia com
tamanha indiscrição e crueldade que chegam a nos assustar: “Vocês viram o
novato? Parece que não toma banho.”; “Vocês ficaram sabendo do ‘fulano’ que
bateu no ‘beltrano’?”; “Aquela peste não tem educação.”; “Fui até a escola hoje
e acabei com a coordenadora por causa daquela tarefa que não concordamos kkk”.
Por que ações assim? Escola e família não jogam no mesmo time? Não deveriam
estar juntas na educação da criança? E como ficam as mães das crianças julgadas
no grupo? E quando o seu filho ou você for o alvo?
Uma criança que apresenta um dia
mais nervoso não significa que surtou na escola; uma criança que perdeu a
paciência com o colega e a empurrou não é um marginal; um objeto que se perdeu
não significa que foi furtado por alguém menos querido da sala ou por um
funcionário de um cargo mais simples; uma professora que foi enérgica não
significa que perdeu o controle ou foi grosseira; uma atitude isolada não se
caracteriza bullying. Por que valorizamos situações fragmentadas e já as
espalhamos sem ir à fonte e averiguar o todo?
Sabemos que as crianças levam
situações ocorridas pelo angulo de sua visão e de seu entendimento, mas uma
atitude madura dos adultos é buscar esclarecimento. Dar a chance de a
instituição investigar e trabalhar o ocorrido. Nem tudo que é dito pela criança
é exatamente como aconteceu. Não significa que ela esteja mentindo, mas ela pode
ter percebido apenas parte do acontecimento. Bom senso e ponderação são
palavras chaves para parceria família e escola. Volto a reforçar: a escola tem
profissionais preparados para dar o suporte necessário a cada situação que
acontece. As crianças precisam vivenciar todos estes conflitos para
amadurecerem e serem adultos saudáveis e autônomos.
Em nossas reuniões de planejamento
curricular, tivemos que incluir um momento para trabalharmos as situações que
as famílias apresentam nesta rede social. Muitas vezes nos admiramos diante de
manifestações preconceituosas, intolerantes e de pouquíssima disposição para a
troca de experiências em família valorizando as diferenças. Trabalhamos
projetos nas escolas para amadurecer os nossos educandos, explorando valores e
princípios, e nos deparamos com uma correnteza contrária aos ensinamentos de
formação humana nos exemplos ocorridos nos grupos de WhatsApp. Acreditamos em
uma educação em sua totalidade. Embora escolarizar seja o nosso papel, não
deixamos de assumir o papel de formação humana que deveria ser da família. Estendemos
a mão às famílias também neste processo.
Não fragmentar o nosso aluno tem sido o nosso maior desafio.
Outro ponto que questionamos é o
movimento dos pais em buscar tarefas e respostas das tarefas nos grupos de
pais. Uma atitude que tem gerado o descompromisso do educando em sala de aula:
“Ah para que anotar? Depois a minha mãe pega tudo no zap zap”. Antes encontrávamos famílias que faziam cópias pelos
filhos (letra diferente, indício de ajuda), hoje a modernidade passou a cópia
para o aplicativo. Será que agindo assim
não percebem o prejuízo futuro? Como serão esses jovens amanhã? Assumirão as
suas responsabilidades ou aguardarão a família resolver tudo por eles? Até resumos
e exercícios para prova já encontramos propagados em grupos de WhatsApp. É como
se dissessem: “Engole aí meu filho, porque a mamãe já mastigou para você”. E a
sala de aula? E o professor? Passam a ser meros coadjuvantes. “Se em casa terei
tudo isso, por que prestar atenção?”. A indisciplina surge e a família não
compreende o motivo.
]
Trago aqui um alerta. Não vamos
utilizar uma ferramenta de aproximação e vínculos em um recurso que nos
transforme em juízes de conduta, em inimigos da escola ou em pais que promovem
a dependência e o comodismo dos filhos.
Não deixem as crianças ficarem
inseguras com a escola pelos comentários e insatisfações discutidas diante
delas, seja pela tecnologia ou presencialmente. A criança aprende com quem a
família autoriza; pais insatisfeitos com a escola enviam mensagens de
desautorização, comprometendo o aprendizado do filho.
A recomendação é que se mantenha
o diálogo presencial com a escola. Se você elegeu a instituição para cuidar da
parte acadêmica de seu filho, certamente foi após análise cuidadosa. Desta
forma, não se deixe influenciar por conteúdos descuidados que circulam
diariamente nas comunidades de WhatsApp, não se permita envolver com ações que
vão contra os seus princípios. Se você não comunga da ideia ou atitude, se
resguarde e procure a escola. Com certeza ela poderá te acolher, esclarecer e
dar as devidas orientações.